Associação Sul-Brasileira
dos Distribuidores de Autopeças

Estamos diante de uma situação inédita para todos nós: uma pandemia sem precedentes que ameaça a saúde global, uma recessão que afeta a economia dos principais países do mundo e uma série de incertezas relacionadas ao “novo normal” e às perspectivas de avanço da ciência no combate ao coronavírus. Com tantos desafios pela frente, projetar os possíveis cenários futuros e definir um plano de ação para cada um deles é a melhor forma de se preparar para encontrar soluções criativas e inteligentes para conseguir prosperar no curto, médio e longo prazo.

Com esse objetivo, a Asdap – Associação Sul-Brasileira dos Distribuidores de Autopeças tem promovido encontros regulares entre seus associados e consultores e profissionais do setor para falar sobre esse momento tão delicado que estamos vivendo e que exige, acima de tudo, consciência e informação consistente sobre o assunto. O convidado para tratar sobre “Os Impactos na Frota e Consumo de Peças pós-Covid-19”, na última semana de abril, foi o analista de Marketing Danilo Fraga, diretor de Inteligência de Mercado da Fraga Inteligência Automotiva.

“Se para o mundo inteiro essa crise é grave, para nós, que estamos no Brasil, onde já havia problemas estruturantes para serem corrigidos, a situação é um pouco mais complicada”, constatou Fraga. “Entretanto, temos, como poucos locais no mundo, uma capacidade de empreendedorismo que está acostumada, de certa forma, a viver nesse ambiente mais instável. Então, se por um lado estamos mais fragilizados, por outro temos um país mais preparado para essas turbulências econômicas, porque elas já fazem parte da nossa cultura e do nosso planejamento”, destacou.

Cenário atual

A performance da indústria automobilística já não era das melhores no início do ano. Janeiro e fevereiro foram meses mais fracos em relação aos resultados obtidos em 2019, mas a expectativa era alta, principalmente para o segundo semestre. Esperava-se que a produção e a venda de veículos novos conseguisse retomar o crescimento devido aos ajustes econômicos e também por conta das variáveis cíclicas da própria indústria. Março, porém, foi um dos piores meses dos últimos anos para o setor, e o mês de abril certamente não apresentou condição alguma de recuperação, visto que todas as montadoras decretaram férias coletivas, lay-off e uma série de medidas que paralisaram a produção de veículos no Brasil em praticamente 80%.

Segundo Fraga, o primeiro prejuízo que isso acarreta para o mercado de reposição são problemas de capital de giro. “Afinal, os fabricantes de peças estão sendo muito afetados financeiramente com o impacto da redução para quase zero da produção”, explicou o analista de Marketing, que acredita que isso trará novos desafios para as relações comerciais entre fabricantes, distribuidores e reparadores de agora em diante.

E, se quando o desempenho das montadoras vai mal, o mercado de reposição geralmente vai bem, o mesmo não vale para o momento atual em função de dois agravantes, um econômico e outro social. “O varejo, principalmente, tem visto que há uma redução muito grande na demanda inclusive por peças de linha leve, porque o isolamento social traz um problema a mais para o mercado de reposição, que é a redução da taxa de quilometragem percorrida. Se as pessoas não estão indo trabalhar de carro, viajando e colocando o carro em uso, o alongamento dos ciclos de troca dos produtos tradicionais do segmento também traz prejuízo para as empresas do setor”, esclareceu Fraga.

Dados divulgados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em fevereiro deste ano estimavam que, depois de crescer 2,9% em 2019, o mercado brasileiro de combustíveis deveria manter a trajetória de alta em 2020. Entretanto, a partir de março, as perspectivas mudaram radicalmente devido à disseminação do coronavírus.

A previsão atual é que o consumo de combustíveis do ciclo otto (gasolina e etanol) tenha uma redução de 10% no total do ano. “Isso significa que, nesses primeiros meses de isolamento e paralisação das atividades econômicas, tivemos uma redução de mais de 50% no consumo de combustível e, consequentemente, na utilização dos carros. Reflexo do trabalho em home office, férias e tudo mais”, ressaltou Fraga. No ciclo diesel, a queda de consumo prevista até o final de 2020 é de 3,95%, visto que os veículos de linha pesada são de uso comercial e, portanto, não estão sofrendo tanto com a paralisação.

Outra variável considerada para medir os impactos que o mercado de reposição terá em função da pandemia é a evolução da frota circulante e o volume de veículos reparáveis. “Se temos um maior número de veículos para serem consertados, teremos um crescimento de vendas pelo menos vegetativo relativo a essa evolução da frota circulante”, identificou o analista de Marketing. “No cenário mais pessimista, no qual é considerado uma queda de 25% nas vendas de veículos da linha leve, 12% nas de caminhões, 10% nas de ônibus, 8% nas de motos e 6% nas da linha agrícola, teremos um crescimento da frota circulante de 0,78%. Logo, a frota circulante não deve cair e, sim,  permanecer praticamente estável, e isso indica que o segmento de reposição não será tão impactado com essa situação do coronavírus no curto prazo”, justificou.

Ao cruzar os dados dessas estimativas, Fraga consegue dimensionar melhor qual o cenário previsto para 2020: “Se compararmos esse índice de crescimento da frota com a queda prevista no consumo de combustível, podemos projetar uma redução, até o final do ano, de mais ou menos 9% nas vendas do mercado de reposição de peças para a linha leve e de aproximadamente 3% para veículos pesados. Ou seja, vamos sofrer muito por conta dessas variáveis de redução da utilização do veículo, receio do consumidor de trocar peças em função do custo e o medo generalizado dentro do segmento que deve gerar impacto negativo para toda a cadeia”.

Em resumo, para o analista de Marketing, são quatro os principais desafios que o setor tem pela frente em consequência deste período de pandemia e paralisação econômica:

  • Renegociação de títulos e prorrogação de pagamentos e o risco de colapso de crédito no segmento;
  • Dificuldade de fluxo de caixa;
  • Adiamento da manutenção do veículo pelo receio de consumir e pela redução da quilometragem percorrida decorrente do isolamento social;
  • Fabricantes de peças de menor poder tecnológico e financeiro podem não resistir à redução da produção pela diminuição de demanda tanto das montadoras quanto do mercado de reposição.

“No entanto, esperamos que esses fabricantes menores também possam ser beneficiados com a redução no volume de importação”, sugeriu Fraga. “Apostamos em uma mudança de perfil de consumo que aumente o índice de nacionalização das peças, reduzindo o número de importações e, consequentemente, aumentando a força desses fabricantes menores que produzem peças nacionalmente”, declarou.

Para finalizar, Fraga apontou as principais demandas que o segmento atacadista está pleiteando junto ao governo brasileiro, por meio das entidades representativas, que são: a suspensão do pagamento de tributos federais por seis meses, a suspensão do pagamento de multas dos tributos federais por seis meses também, a concessão de uma linha de crédito exclusiva para as pequenas e micro empresas, com seis meses para começar a pagar em 24 parcelas e com juros comeptitivos, e a flexibilidade na legislação trabalhista para a suspensão de contratos de trabalho, demissões, férias coletivas, etc. “Muitos desses pontos já foram atendidos pelo governo e outros estão em estudo”, disse ele.

“Esperamos principalmente que o crédito seja liberado com uma facilidade um pouco maior, porque o que temos visto é que o crédito chegou às instituições financeiras, mas não está chegando com a velocidade necessária na ponta”, observou Fraga. “Nesse sentido, o empresário Henrique Steffen, presidente da Asdap, anunciou estar em tratativas com o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) para obter uma linha de crédito com condições e taxas especiais para as empresas do setor que serão divulgadas em breve.

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