Possivelmente, o Deserto de Atacama seja um dos destinos mais cobiçados por motociclistas na América do Sul. As paisagens de tirar o fôlego, com lagoas, salinas e vulcões, os animais e as plantas característicos da região são convidativos para uns dias de folga, descanso e reflexão. Sobre duas rodas, então, ainda mais.
Essa ideia já fazia parte dos planos do terapeuta holístico Leonardo Franceschini há muitos anos. “Tive uma viagem planejada com dois amigos (para o Atacama) que acabou frustrada, porque a moto de um deles quebrou uma semana antes da viagem, sem tempo de consertar, e o outro não quis fazer a viagem só em dois”, lembra ele.
Dois anos e meio se passaram depois desse quase sonho realizado, quando, por intermédio do seu mecânico de confiança, Franceschini conheceu a dupla que viria a ser sua parceira de aventuras pelas estradas da Argentina, Chile e Uruguai: o empresário Rogerio Tomasini e o representante comercial Gerson Gellatti. “Eles já tinham ido para San Pedro de Atacama. O Rogerio é um viajante de moto muito experiente”, conta o motociclista.
Rogerio Tomasini (E) e sua Yamaha Super Ténéré 1200, Gerson Gellatti (C) e sua Honda VFR 1200 e
Leonardo Franceschini (D) e sua Honda Transalp 700
O roteiro final resultou da junção de duas propostas: passar pelo Atacama, contemplando a vontade de Franceschini e Gellatti, e voltar pela Carretera Panamericana, costeando o oceano Pacífico e, assim, atendendo o desejo de Tomasini. “Foi uma experiência muito legal, porque descemos essa estrada tendo o Pacífico à direita e a cordilheira (dos Andes), bem pertinho, à esquerda. Inclusive conseguimos ver as nuvens de chuva se espremendo contra a cordilheira e não conseguindo passar, o que justifica o clima desértico de boa parte do Chile e do altiplano”, relata Franceschini.
Da ideia à execução, foi cerca de um ano de planejamento – que ficou a cargo do experiente viajante de moto Tomasini –, incluindo a definição dos dias de viagem, os trechos e as quilometragens a serem percorridos, os possíveis locais de hospedagem e a localização dos postos de combustíveis. “Fazíamos um trecho por dia, pela manhã, sempre com a ideia de chegar na próxima cidade no começo da tarde, poder se instalar no hotel e curtir um pouquinho daquele lugar”, descreve Franceschini. “Nenhum hotel foi reservado antecipadamente, mas tínhamos de duas a três opções por localidade para não precisar rodar muito atrás disso. Um planejamento dos postos de gasolina também é bastante importante porque são poucos, tanto na Argentina quanto no Chile. Às vezes, ficamos 200 quilômetros sem passar por um.”
No total, foram 16 dias de viagem e 13 trechos percorridos. “Paramos três noites em San Pedro de Atacama e duas em Viña del Mar. Fora isso, fazíamos um trecho por dia, sempre saindo cedo”, destaca Franceschini. O grupo saiu de Bento Gonçalves em 31 de outubro e retornou dia 15 de novembro. “Os dois trechos no Brasil foram os mais difíceis, porque as estradas são piores, tem mais movimento e muita fiscalização”, considera o viajante.
Segundo ele, não houve nenhuma grande dificuldade no caminho. Os principais desafios foram mesmo as oscilações de temperatura e o vento. “O vento lateral é algo bem delicado, temos que reduzir bastante o ritmo e a viagem se torna cansativa”, explica. “Tivemos alguma preocupação com as motos porque, em um determinado momento, elas começaram a ter alguma dificuldade em função do ar rarefeito, mas no final deu tudo certo. À medida que começamos a descer, ficou tudo bem de novo.”
O ponto alto da viagem, para Franceschini, não poderia ser outro. “Sem dúvida, é a estrada. Dos 7,5 mil quilômetros percorridos, acredito que pelo menos 6 mil deles são de paisagens realmente magníficas. Nos sentimos dentro de um filme”, define ele. “Em um veículo fechado, ficamos isolados do ambiente externo. Claro que as paisagens continuam lindas, mas é como se estivéssemos assistindo um filme. Já com a moto, passamos a fazer parte desse filme. Sentimos a temperatura, a umidade, os cheiros, ouvimos os sons”, defende o motociclista.
A experiência foi tão positiva que o grupo de amigos já retornou de viagem planejando a próxima para janeiro de 2021. “Pretendemos ir até Santiago. Vamos pegar um pouco do trecho que pegamos na volta, depois descer até o Sul de Santiago, visitar a região dos Lagos e Bariloche”, conta Franceschini, já empolgado com a próxima aventura, mas ainda assimilando os aprendizados e as sensações recentes. “Foi uma viagem em que me conectei muito com a gratidão. Fiquei grato pelo que estava fazendo, por aquilo que estava vendo, pelos lugares que estava passando. Senti gratidão de uma forma como nunca tinha sentido antes”, revela.
Com relação ao significado da moto em sua vida, ele resume: “É viver com paixão. Manter a paixão como combustível para a vida, como uma bússola, um Norte para que eu sempre sinta prazer, alegria, veja sentido nas coisas e faça minhas tarefas com um impulso natural, sem ter que ficar me motivando. A moto se encaixa perfeitamente dentro dessa ideia. Tudo que faço com moto deixa as coisas mais coloridas e é isso que ela representa para mim”.
Confira os 13 trechos percorridos pelo grupo:
A) Bento Gonçalves > B) Uruguaiana > C) Presidencia Roque Sáenz Peña > D) Salta > E) San Pedro de Atacama > F) Antofagasta > G) Copiapó > H) La Serena > I) Viña del Mar > J) Mendoza > L) Córdova > M) Paysandú > N) Rivera > Bento Gonçalves
Fotos: Arquivo Pessoal