Era uma vez um estudante de publicidade e propaganda que resolveu abrir uma agência com outros colegas para trabalhar na profissão em que iniciavam a graduação. Hoje, 26 anos depois, Alexandre Sibemberg Saint Pierre, 45, casado e pai de um casal de filhos, ex-professor universitário por 18 anos, fabrica e exporta capacetes únicos, sofisticadamente produzidos, por fora e por dentro, de acordo com a imaginação e a vontade do cliente.
“Não tenho limites. O cliente pode pedir o que quiser que eu vou atrás e faço”, afirma Pierre, dono da internacionalmente conceituada marca Joe Cabot. Quem estiver interessado em um capacete desses, porém, terá que entrar na lista de espera, que atualmente está em maio de 2019.
Essa história que mescla inconsequência, originalidade, acasos, sustos e adequações começou quando um dos sócios da agência comprou uma moto. “Poucos meses depois, no Natal do mesmo ano, fui lá e comprei uma igual. Nunca tinha andado de moto. Comprei por impulso. Só no ano seguinte é que fui aprender. Desde então, nunca mais parei”, conta Pierre, um motociclista que revê seu grupo, em média, a cada dois meses, mas não deixa de fazer pelo menos uma grande viagem – cerca de sete ou oito mil quilômetros – por ano. Com a moto, surgiu a ideia de desenhar, e depois produzir, um capacete diferente, exclusivo. Os amigos gostaram do resultado, passaram a fazer encomendas e o hobby daquele jovem publicitário foi crescendo.
Quando um dos sócios se afastou da agência, os meninos ousaram convidar para entrar no lugar dele um professor da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) com quem tinham feito amizade. O professor aceitou e, envolvido nas atividades da agência, começou a precisar de “cobertura” na docência. Pierre foi lá “quebrar o galho”, deu conta do recado e, seis meses depois, foi convidado para ser professor substituto. O advento da internet e a banalização crescente da publicidade foram perdendo espaço para os alunos e o universo acadêmico e, em 2013, Pierre já era o coordenador do curso de Cinema da Ulbra, com dedicação de 40 horas semanais à Universidade. Deixou a agência de lado, porém continuou fazendo seus capacetes.
Foi em maio daquele ano que a vida dele começou mais uma mudança importante em função de um acidente de moto. “O tempo foi passando e eu não conseguia me recuperar direito. Respirava com dificuldade, parecia ter uma gripe mal curada. Até que, em julho, descobri que estava com um problema na válvula mitral”, lembra Pierre. Ele tentou ainda se curar apenas reduzindo a carga horária aos poucos, mas, depois de dois anos, achou melhor abandonar a docência. Passou a dedicar mais tempo ao tratamento de saúde e ficou apenas produzindo seus capacetes. Mais focado, então, limitou sua produção a seis capacetes por mês.
“O tempo de fabricação de um capacete, assim como o preço, depende muito do que o cliente deseja. Quando não tinha espera, eu pedia um prazo de 30 a 40 dias úteis do pedido, para passar pela criação, produção propriamente dita e chegar ao despacho final para o cliente. Diminui de dez, naquela época, para seis unidades por mês, porque faço questão da qualidade, de entregar um serviço perfeito, com acabamento impecável. E, geralmente, entrego até antes do prazo combinado”, destaca Pierre, que não abre mão da peça única, sem outro igual.
Certa vez, Pierre recebeu um cliente que queria fazer dois capacetes iguais, um para ele e outro para a esposa. Ele, então, explicou que não fazia. O cliente insistiu: “Mas quero os dois iguais. O que você pode fazer?”. A resposta estava pronta: “Posso ajudar você a procurar outra pessoa que queira fazer esse serviço”.
Apontando para a parede de seu atelier (foto em destaque), onde tem 20 capacetes expostos, ele diz que servem de mostruário para dar ideia aos clientes do que é possível fazer. “Na verdade, é sempre o mesmo modelo de capacete, aberto, só faço este. Além da pintura externa, é possível escolher o tecido interno, a cor da linha, o tipo de costura, o bordado a ser feito, o tipo de cinta que vai prender o queixo… É o conjunto dessas definições que vai determinar depois o preço e o tempo de produção”, explica Pierre. Também é comum a instalação de intercomunicadores internos nos capacetes, o que possibilita ao piloto da moto conversar não só com o carona, como com qualquer outra pessoa em um raio de dois a três quilômetros, e fazer um link com o telefone celular para, por exemplo, ouvir música, rádio ou mesmo telefonar.
Entretanto, assim como toda regra tem sua exceção, Pierre tem a sua. Já atendeu uma solicitação de reproduzir o capacete de Ayrton Senna e personalizou o capacete profissional de um piloto australiano da equipe Red Bull, o serviço mais caro que fez até hoje. Sobre valores, para efeito comparativo de preços praticados por lojas do ramo, onde um capacete pode custar de R$ 120 até R$ 25 mil, os seus têm preço inicial de R$ 1,5 mil para fazer o básico: “uma cor só por fora, com a minha marca, um forro padrão preto e sem bordado. A partir disso, tudo o que se fizer tem preço”, resume.
Entre uma de suas tantas histórias está a de um capacete que ele entregou recentemente e teve bastante repercussão nas redes sociais. Foi encomenda de um historiador de Caxias do Sul (RS) que conseguiu um capacete original dos soldados da Guerra do Vietnã e solicitou a adaptação. Outro que ele lembra foi um dos mais demorados para fabricar este ano, forrado com folhas de tabaco. No inverno, com umidade, levou mais de três meses para ficar pronto.
O rol de seus clientes é composto basicamente de motociclistas e a maioria deles de pilotos de rali, mas há quem compre para presentear alguém e outros que usam apenas de decoração. Cerca de 70% dos capacetes que a Joe Cabot fabrica atualmente – entre 60 e 70 unidades por ano – vão para o exterior. O cliente mais assíduo, porém, é um ponto fora dessa curva. “Tenho um cliente em Los Angeles, nos Estados Unidos, que tem uma meia dúzia, mas o campeão é um cirurgião plástico de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, que já tem muitos. Ele criou um espaço na clínica com a temática de moto, para os maridos das pacientes que ficam lá esperando as intervenções, e comprou vários para compor a decoração”, relata Pierre.